Simulado Câmara Municipal de Belo Horizonte - CMBH | Técnico Legislativo II | 2019 pre-edital | Questão 27

Língua Portuguesa / Conhecimento da língua / Emprego do nome


O tempo da delicadeza

A paixão terminou, o amor é uma lembrança irresgatável, mas ainda há tanta presença e ternura...
Abraços podem durar um tempo enorme. A gente se inclina na direção do outro, cheio de sentimentos
conturbados, e ele nos segura com força, como se tentasse comunicar alguma coisa. É possível sentir um coração
batendo contra o outro, perceber no peito a outra respiração. Tantas coisas estão contidas nesse gesto, tanta ternura,
tanta dúvida. Amor. Quando o abraço se desfaz, fica um sorriso indeciso, uma expressão incompleta nos olhos, o
movimento de um corpo que se afasta e parece dizer adeus.
Como todo mundo, tenho sentimentos ambivalentes sobre relacionamentos que acabam. São momentos tristes,
terrivelmente tristes. Mas, ao fim e ao cabo, inevitáveis. A gente não pode passar a vida preso a coisas que já não
respiram. Mesmo cheios de dúvidas e ainda repletos de carinho, em algum momento é preciso romper, andar,
recomeçar. O abraço que não quer terminar é lindo, mas abre uma porta para lugar nenhum. É necessário sair dele para
ser de novo uma pessoa inteira – e ter a chance, adiante, de estar inteiro em outro abraço.
Esses momentos de ruptura são essenciais em nossa vida. As separações, assim como os encontros, nos definem –
inclusive por que costumam levar um tempo enorme. A gente passa um ano juntos, apaixonados, e podemos levar o
dobro nos separando de verdade, fazendo a ruptura das almas. Separar dois corpos é fácil, mas como se faz para tirar o
outro de dentro de si?
Com todos os problemas e dificuldades, gosto de pensar nesse período de sentimentos estendidos como o tempo
da delicadeza. (Obrigado, Chico Buarque, por esta e tantas outras coisas.) A paixão terminou, o amor é uma lembrança
irresgatável, mas ainda há presença e ternura. Enormes. A raiva ficou para trás. A frustração gastou-se. O ciúme raspa as
unhas nas paredes do porão, lá embaixo, mas a cada dia incomoda menos. Os sentimentos dolorosos – quase todos –
deram lugar a uma sensação agridoce de cumplicidade. Ainda não é possível desejar que ela ou ele seja feliz em outra
companhia, mas esse dia chegará, um dia.
Acredito – enfim – que é possível deixar de amar amando. O afastamento pode ser feito com ódio, mas fica uma
ferida imensa, dura de cicatrizar. Podemos cortar as pontes repentinamente, com medo de um sofrimento duradouro,
mas isso vai nos assombrar no futuro, na hora de amar de novo. Enfim, há diferentes maneiras de deixar de amar. Eu
acho possível – e louvável – sair da intimidade do outro com um sorriso nos lábios e lágrimas nos olhos. Sair, mas ficar
feliz em vê-lo, contente de ouvi-la, ainda ter vontade de contar a essa pessoa que nos conhece tão bem tudo que
aconteceu na semana passada, mas escolhendo não contar – por pudor, e porque, afinal, já não cabe.
Sou capaz de antecipar o olhar de descrédito do leitor e da leitora. Não é assim que funciona, ele ou ela dirá. Se os
sentimentos são bons, as pessoas não se separam. Mas isso não é verdade. As pessoas rompem cheias de bons
sentimentos, transbordando deles, a ponto de não saber o que fazer com tudo aquilo. Exceto as exceções, exceto os
traumas e barbaridades, a gente não deixa de querer de uma hora para outra. A paixão acaba, é certo. O amor, aquele
de querer ficar colado para sempre, também acaba. Mas há sentimentos lindos que ainda ligam ex-casais. Tão lindos
que entalam na garganta, que temos vontade de abraçar e não largar. Lembra?
Pois então, respeitemos os nossos sentimentos delicados. As relações terminam, mas isso não é o fim dos afetos.
Não há que ter vergonha de gostar da ex que você mesmo deixou, não há problema em pensar com carinho (e sem
raiv(A) naquele desgraçado que não quis continuar. Dentro de nós há tanta coisa ruim que não deveríamos resistir
quando se manifesta uma doçura. Melhor abraçá-la bem forte, acolhê-la como um amor que estivesse de volta. Apenas
para uma visita, mas, ainda assim, bem-vindo. (Ivan Lins. Disponível em: http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/ivan-martins/noticia/2016/06/o-tempo-da-delicadeza.html.)

“As separações, assim como os encontros, nos definem – inclusive por que costumam levar um tempo enorme.” (3º§) Sobre o trecho sublinhado, é correto afirma que exprime a ideia de:

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Fonte: TéCNICO AMBIENTAL / Pref. Imigrantes/ES / 2016 / CONSULPLAN