Simulado Instituto Nacional de Propriedade Industrial | Analista - Administração Geral - Administração (cargo 10) | 2019 pre-edital | Questão 197

Língua Portuguesa / Domínio da ortografia oficial / Emprego das letras


Confissão de Allan Poe Cometi apenas um erro. Não soube ser feliz. Nunca:
nem um só dia, nem sequer uma hora. A própria criação, um
prazer para os poetas mais sensíveis, foi para mim sempre mais
angustiante que redentora. A causa primeira do meu infortúnio,
conheço-a agora. Tive sempre medo da vida. De uma
sensibilidade exacerbada e doentia desde a mais tenra infância,
atormentada e mortificada até a exaustão pelo infortúnio e pela
miséria, a vida banal, as realidades quotidianas constituíam para
mim uma fonte constante de terror. Tinha a impressão de viver
continuamente suspenso no limite de dois reinos — ser uma
criança semimorta unida em laço misterioso a um espectro
nostálgico. A criança tinha medo da treva; o espectro da luz.
Uma e outro aspiravam à morte e, simultaneamente, receavam-
na. A vida era para mim aborrecimento, alucinação,
condenação. Cada vez que eu tentava reconciliar-me com ela,
saía maltratado, repelido. Fazia-me o efeito de um anjo que
pretendesse participar num banquete de monstros. O próprio
amor não logrou salvar-me porque a mulher é uma das mais
perfeitas encarnações da vida, e eu tinha da vida um indizível
terror. Todas as mulheres que julguei amar ou fugiram de mim,
ou estão mortas. Uma vez mortas, e só então, elas pareciam
realmente minhas amantes na eternidade, as únicas que
poderiam amar um homem segregado da vida. Para escapar às
minhas visões terrificantes, aos meus pesadelos, às tentações de
minha razão delirante, um gênio forçava-me a escrever, senhor
mais titânico e exigente que um demônio. Escrevi, pois, toda a
minha vida poemas, narrativas, contos, tratados, ensaios.
Porém, mal experimentava a ilusão de pela poesia ter
exorcizado a perseguição dos meus pavores, logo outras
alucinações, outros pesadelos, outras bizarrias macabras e
fúnebres assaltavam sem trégua a minha pobre alma
acabrunhada. Então, como última esperança do meu desespero,
buscava socorro no álcool, que, aliás, abominava. Revista Literatura. São Paulo: Escala Editorial, 2009, n.º 23, p. 45 (com adaptações).

Considerando as estruturas linguísticas do texto acima, julgue os itens de 1 a 7.

Para a palavra “quotidianas” (L.8), está também prevista, nos dicionários da língua portuguesa, a grafia cotidianas.

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Fonte: ADMINISTRADOR / FUB / 2009 / CESPE