Simulado Tribunal Regional Federal - 4ª Região | Analista Judiciário - Oficial de Justiça Avaliador Federal | 2019 pre-edital | Questão 714

Português / Sintaxe


Uma amiga me disse que em alguns cursos da Universidade de Princeton o celular e o tablet foram proibidos porque os
estudantes filmavam e fotografavam as aulas, ou simplesmente brincavam com joguinhos eletrônicos. A proibição do uso de
aparelhos eletrônicos em sala de aula numa das maiores universidades dos Estados Unidos não é desprezível. O celular na palma da
mão desconcentra o estudante e abole uma prática antiga: a caligrafia.
Dos milenares hieróglifos egípcios gravados em pedra e palavras escritas em pergaminho à mais recente prescrição médica, a
caligrafia tem uma longa história. Mas essa história − que marca uma forte relação da palavra com o gesto da mão − parece fenecer
com o advento do minúsculo teclado e sua tela.
Lembro uma entrevista com Roland Barthes, em que o crítico francês dizia que as correções das provas tipográficas dos
romances de Balzac pareciam fogos de artifícios. É uma bela imagem do efeito estético da caligrafia no papel impresso. Quando pude
ver essas páginas numa exposição de manuscritos, fiquei impressionado com a metáfora precisa de Barthes, e admirado com a
obsessão de Balzac em acrescentar, cortar e substituir palavras e frases, e alterar a pontuação. O autor de Ilusões Perdidas não
poupava esforço para alcançar o que desejava expressar, e esse empenho tão grande acabou por exauri-lo quando escrevia seu
último romance.
Mas há beleza também na caligrafia torta e hesitante de uma criança, numa carta de amor escrita a lápis, na mensagem
pintada à mão no para-choque de um caminhão, no muro grafitado da cidade poluída.
Num de seus poemas memoráveis, “O Sobrevivente”, Carlos Drummond de Andrade escreveu à mão e depois datilografou:
“Há máquinas terrivelmente complicadas para as necessidades mais simples. / Se você quer fumar um charuto aperte um botão”.
Na mão que move a escrita há um gesto corporal atávico, um desejo da nossa ancestralidade, que a maquininha subtrai, ou
até mesmo anula. Ainda escrevo alguns textos à mão, antes de digitá-los no computador. No trabalho diário de um jornalista, isso é
quase impossível, mas na escrita de uma crônica, pego a caneta e o papel e exercito minha pobre caligrafia.
Talvez eu seja o antepenúltimo dinossauro. Mal escrevo essa palavra, vejo um dos minúsculos seres que se originaram de um
dinossauro emplumado. É um pássaro que desconheço; pousou num galho do manacá florido, e seu canto misterioso me remete ao
livro A Linguagem dos Pássaros, escrito no século 12 pelo poeta persa Farid Ud-din Attar. Nele, a caligrafia é sinônimo de “beleza da
escrita, linguagem da mão e nobreza do sentimento”. (Adaptado de: Milton Hatoum. Disponível em: cultura.estadao.com.br)

O segmento em que se exprime noção de finalidade está em:

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Fonte: ANALISTA EM GESTãO ESPECIALIZADO DE DEFENSORIA - CIêNCIAS CONTáBEIS / DPE/AM / 2018 / FCC